Linhas de Pesquisa

A linha de Pesquisa “Etnologia e Etnohistória” está profundamente vinculada à história dos estudos etnológicos na Bahia e, mais estreitamente, ao PINEB, programa de pesquisa que há mais de trinta anos se dedica à pesquisa etnológica e etnohistórica das sociedades indígenas no Brasil, em geral, e no Nordeste, em particular.

A Faculdade de Filosofia da Bahia existe desde os anos 40 do século XX e tem tido uma relação quase que permanente com estudos de povos indígenas. Uma das suas figuras mais ilustres e destacadas foi Thales de Azevedo e este sempre demonstrou interesse pela presença dos povos indígenas na história do Brasil, tendo estudado as relações entre missionários e índios e pesquisado os primórdios das relações interétnicas em sua obra pioneira sobre o desenvolvimento da cidade do Salvador. Mais tarde, por ocasião da criação do Departamento de Antropologia e Etnologia, o professor Carlos Ott se interessou pela arqueologia e pré-história da Bahia e publicou, também, algumas obras pioneiras sobre o tema. Nota-se, no entanto, que, não obstante uma certa visibilidade granjeada por esses estudos, como o atesta uma visita histórica de índios Kraho à Faculdade de Filosofia, no início de sua existência, as pesquisas infletiam para a história ou etnohistória e pouco se detinham sobre os povos indígenas contemporâneas. 

Nesse sentido, apenas em 1971, após a chegada ao Departamento de Pedro Agostinho da Silva, procedente da Universidade de Brasília, é que têm início os estudos de etnologia indígena contemporânea. Pedro Agostinho recém concluíra uma pesquisa de campo entre os Kamayurá do Alto Xingu, um estudo muito conhecido no campo da etnologia, em que aborda o ritual Kuarup. Instalado na Bahia, ele decidiu não somente que era relevante estudar os índios considerados pouco “aculturados”, mas também um pequeno número de povos conhecidos no Estado e praticamente ignorados pela antropologia da época. No Nordeste, à época, havia poucos e esparsos estudos sobre esses povos, usualmente considerados como em vias de extinção a partir do ponto de vista da “aculturação”. Ao desembarcar, com alguns alunos, no sul da Bahia, onde estavam estabelecidos os Pataxó da Aldeia de Barra Velha, Pedro Agostinho deu partida a um Grupo de Pesquisa que floresceu e persiste, até hoje, como o mais importante centro de estudos dos povos indígenas no Nordeste, redenominado Programa de Pesquisas Povos Indígenas do Nordeste Brasileiro, PINEB. 

Inicialmente, o grupo se dedicou a formar estudantes e encetar estudos etnográficos dos povos indígenas na Bahia. Nesse processo formaram-se ou participaram vários dos atuais professores do Departamento, tais como Maria Rosário Carvalho (atual coordenadora do PINEB), Carlos Caroso e Edwin Reesink. Desse modo, produziu-se um conhecimento antes inexistente. O PINEB tem se dedicado, inclusive, a repensar teoricamente a questão, assim como a apoiar a emergência de povos indígenas, baianos e nordestinos, como atores políticos. Nos anos oitenta, o campo de investigação se ampliou com as pesquisas de Maria Rosário Carvalho e Edwin Reesink entre os Kanamari da Amazônia Ocidental, pesquisas que resultaram em suas teses de doutorado. 

Não obstante estudantes de diferentes níveis tenham se engajado, desde a década de 1970, foi a partir de meados dos anos de 1990 que houve uma expansão de pesquisas e maior inserção de estudantes, mediante a concessão de bolsas Pibic e CNPq. A partir de 1995, ademais, o PINEB formaliza a sua inserção como Grupo de Pesquisa no CNPq e desde então vários “projetos integrados” têm sido financiados com número variado de bolsistas. Assim, por exemplo, cabe destacar o importante esforço de levar ao cabo o Fundo de Documentação Histórica Manuscrita sobre Índios no Brasil, à base de um projeto pioneiro elaborado por Agostinho, para reunir toda a documentação sobre Índios na Bahia, recolhida, preliminarmente, em arquivos na Bahia, e posteriormente em arquivos nacionais e estrangeiros, transcrevê-la paleográfico-diplomaticamente conforme normas rigorosas e, finalmente, reuni-la em CD-ROM para consulta por parte de pesquisadores e público geral. 

Complementarmente, houve uma expansão da pesquisa em termos regionais para estendê-la a todo o Nordeste. Nesta fase Marco Trombone Souza Nascimento, outro professor lotado no Departamento, atualmente em fase de doutoramento, produziu a sua dissertação de mestrado. Em suma, esta linha de pesquisa é o resultado e a consolidação de mais de trinta e quatro anos de contínua pesquisa etnológica e etnohistórica. Ao longo desses anos, têm-se experimentado avanços muito significativos em termos etnográficos e teóricos, com produção bibliográfica significativa, em que se destacam pesquisas sobre emergência étnica, fenômenos religiosos como o Toré, sistema de dominação interétnica e etnohistória, recobrindo os contextos etnográficos do Nordeste e Amazônia. 

Atualmente, os pesquisadores engajados prosseguem realizando pesquisas entre povos indígenas no Nordeste e na Amazônia: há, entre outras, uma pesquisa sobre xamanismo entre os Kiriri (Ma. Rosário Carvalho; financiamento CNPq) e outra sobre história de vida e etnohistória entre os Lakondê e Sabanê (partes do conjunto Nambikwara, conduzidas por Edwin Reesink, com financiamento CNPq) e o engajamento permanente de bolsistas, sob várias modalidades. Trata-se, pois, de uma linha de pesquisa que expressa acumulada experiência, sempre posta ao serviço da etnologia e etnohistória produzidas no Departamento de Antropologia e Etnologia da FFCH-UFBA. 

A partir dessa longa tradição, experiência e conhecimento acumulado, esta linha de pesquisa se propõe a dar continuidade à produção do conhecimento sobre: 

a) Etnohistória dos povos indígenas, sobretudo aqueles situados no Nordeste e na região amazônica, através de documentação e história oral desses povos; 

b) elaboração de etnografias e etnologias que dêem conta da dimensão simbólica, mitológica, estrutural e organizacional de sociedades indígenas; 

c) relações de contato e de dominação entre as sociedades indígenas e o Estado brasileiro; 

d) etnogênese de povos indígenas, especialmente no Nordeste brasileiro e 

e) teorias e metodologias construídas pela antropologia para a produção etnográfica e etnológica.